Por Carlos Amado
Até estou de acordo com o título que tantos “comentadores” e outros ditos independentes, ligados sempre aos grandes grupos financeiros que exploram a actividade privada, mas que por seriedade intelectual deveriam apontar como responsável a ideologia de direita que, desde a fundação do SNS, tudo tem feito para o destruir (por “acaso” ou talvez não, o PPD votou contra o SNS!).
O próprio Sistema de Saúde em que se inclui o SNS é sujeito a debate político, mas a saúde tal como é definida pela OMS é a mesma independentemente do setor e do enquadramento de que estejamos a falar.
Houve um largo consenso nacional, motivo pelo qual o SNS é considerado por todos uma das maiores conquistas de Abril, apesar de uns o quererem mais como serviço público, outros, mais à direita, mais de pendor privatista.
Vamos a factos:
1 – Em 1971 (!) foram publicados os Decretos-Lei n.º 413 e 414 como parte da
"Legislação Gonçalves Ferreira", que visou a reforma do sistema de
saúde e assistência em Portugal. O Decreto-Lei n.º 413/71 estabeleceu a
organização do Ministério da Saúde e Assistência, enquanto o Decreto-Lei n.º
414/71 definiu o regime jurídico das carreiras profissionais dos funcionários
do Ministério da Saúde de então. Havia várias realidades na saúde pelo país.
Lembrar que Portugal, à época, só dispunha de dois
hospitais públicos, o Hospital de S. João e o Hospital de St.ª Maria, bem como
de laboratórios, nos centros de saúde distritais, para a realização de análises
clínicas, incluindo apoio à pesquisa de tuberculose detectada via SLAT (as
vulgares micros que todos fazíamos na escola), bem como do controlo da
qualidade de águas de consumo, recreio e termais, tendo para tal o apoio
científico do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA).
Tal legislação, que resultou do
conhecimento e experiência científica do Dr. Gonçalves Ferreira, sub-secretário
de Estado da Saúde de Marcelo Caetano e do Dr. Arnaldo Sampaio (pai do “nosso”
Jorge Sampaio), director-geral de Saúde, claro, “dois perigosos esquerdistas”,
foi sempre boicotada quer pelo atraso na sua implementação, quer mesmo após o
25 de Abril e com especial incidência nos governos do PPD/CDS, retirando
competências no apoio analítico que era feito às consultas nos centros de
saúde, ao mesmo tempo que floresciam como cogumelos os laboratórios privados,
para aonde eram encaminhados os doentes, deixando um número residual a serem
atendidos pelos laboratórios públicos, até que, de um laboratório por distrito
(18), passámos para cinco.
Aqui está o primeiro exemplo do
bloqueio ideológico da direita!
2 – Outro dos slogans é que
existem “listas de espera para cirurgias, consultas de especialidade e no
acesso ao médico de família”.
Ora, sobre os cuidados de saúde
primários, estão mal informados, pois se é residual, na zona Norte, o número de
utentes sem médico de família, porque será que no resto do país tal não se
passa?
Será que o número de unidades de saúde
familiar (USF) tem tido a implementação que seria desejável, quando os
profissionais não aceitam deixar o privado, por imperativos de habitação, custo
de vida e outros, continuando sem existir mecanismos que os cativem?
Podem ter razão sobre a espera para
cirurgias e consultas de especialidade. Mas... de quem tem sido a culpa de
impedir a abertura de mais vagas nos cursos de Medicina e de serem criadas mais
faculdades de Medicina?
Da situação anacrónica (apoiada pela
direita) de uma Ordem dos Médicos continuar a ter o privilégio de impedir tal
desiderato!
E os sucessivos responsáveis pelo
Ministério da Saúde, que nunca se preocuparam com a distribuição de
profissionais de saúde, cuja formação é paga por todos os contribuintes, pelo
todo nacional, mau grado Portugal ter um dos melhores rácios de médicos por mil
habitantes da Europa.
Aqui está o segundo exemplo de
bloqueio pela direita!
3 – Os tais “independentes” comentadores que muito gostam de enumerar a existência de unidades de saúde, privadas e de IPSS, e interrogam-se sobre a existência de listas de espera.
Claro que “inocentemente” desvalorizam os protocolos entre as unidades públicas de saúde e os privados e IPSS para a realização de cirurgias, já que esses privados, no que diz respeito a consultas de especialidade, não têm, ao contrário do que afirmam, quadros médicos para tal.
Mais, como certamente tiveram
experiência pessoal ou por conhecidos e familiares, quando as intervenções
cirúrgicas são de grau de complexidade maior, os privados e as IPSS não as
aceitam, até porque não dispõem de unidades de cuidados intensivos em número
suficiente para que pudessem dar resposta; a sua manutenção técnica e humana é
dispendiosa, e só o SNS consegue dar resposta.
Não esquecer algo que os mesmos varrem
para debaixo do tapete. Durante a pandemia da COVID-19, os privados e IPSS
fecharam as portas, não se preocupando com a tal complementaridade, ficando
quase em exclusivo com as determinações analíticas, enquanto os laboratórios
públicos só residualmente as realizavam.
Afirmar, como fazem, que “fixou-se a
esquerda retrógrada (seja lá o que isso for) no SNS como único prestador de
serviços” é FALSO, como atrás enumerámos.
O que tem sido feito é que o privado,
sem regras e controlo, em “roubar” ao SNS os seus quadros, que foram formados
com o dinheiro de todos os contribuintes, desnatando o SNS de quadros ao mesmo
tempo que os partidos de direita têm sucessivamente impedido a criação de novas
metodologias de exclusividade, bem como medidas de compensação ao Estado pela
saída do SNS, aliás como existe, por exemplo, para os pilotos da nossa Força
Aérea.
Aqui está o terceiro exemplo do
bloqueio pela direita.
4 – Por fim, os tais comentadores
muito gostam de afirmar do alto da sua cátedra que “uma das parvoíces da
esquerda é afirmar que a saúde não é um negócio”. Mais uma vez, fazem
afirmações sem qualquer fundamento, a não ser propaganda liberal/direitista, pois
no nosso quadro legal existe o Sistema Nacional de Saúde, que engloba o SNS, os
privados e as IPSS (que, naturalmente, terão lucros da sua actividade), mas o
que deixam entendido com tanto ataque “à esquerda” é que, para eles, o melhor
sistema era o de acabar com o SNS e deixar TUDO na mão dos privados.
Nem com o mau exemplo vindo dos
Estados Unidos da América, com a falência dos seguros de saúde, que deixou
milhões de americanos sem direito a cuidados de saúde porque as pessoas não
ganham o suficiente para pagar um novo seguro de saúde, e só no tempo de Barack
Obama, com a criação do Obama Care, se criaram condições para reverter a
situação. Pois nem isso os faz vacilar na sua demagogia.
Aqui está o quarto bloqueio pela direita, que tudo tem feito para nos vender ilusões!
Felizmente, a maioria dos portugueses está “vacinada” contra o vírus liberal/direitista!
Ação Socialista:
https://www.accaosocialista.pt/?edicao=1744#/1744/ideologia-o-bloqueio-da-saude
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