28 março 2025

Da (não) reparação dos acidentes de trabalho na Administração Pública (Acção Socialista n.º 1688 de 27.03.2025)

Autor (a): Ludovina Sousa 

O artigo 59.º da Constituição consagra o direito de todos os trabalhadores à assistência e justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou de doença profissional, bem como à prestação de trabalho em condições de segurança, higiene e saúde, o que envolve a adopção de políticas de prevenção dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais.

A reparação de acidentes de trabalho na Administração Pública (AP) rege-se pelo disposto no decreto-lei 503/99 de 20 de novembro. Este diploma atribui à entidade empregadora a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes dos acidentes e doenças profissionais, bem como a competência exclusiva para a qualificação do acidente e mantém o princípio da não transferência da responsabilidade para entidades seguradoras, excepção das autarquias locais. Atribui à Caixa Geral de Aposentações a responsabilidade pela reparação em todos os casos de incapacidade permanente.

O citado normativo foi alterado pela Lei n.º 11/2014, de 6 de março, que veio estabelecer mecanismos de convergência do regime de protecção social da função pública com o regime geral da segurança social conferindo ao artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, alterações no regime de acumulação de prestações por incapacidade permanente resultante de acidente ou doença profissional com remunerações ou pensões.

Em virtude da solução normativa vertida na alínea b), do n.º 1 do artigo 41.º do supra citado regime, em caso de incapacidade permanente parcial resultante de acidente de trabalho ou doença profissional, tendo em conta a natureza indemnizatória da prestação periódica a que o trabalhador sinistrado tem direito, tal prestação não é acumulável com a parcela da remuneração que corresponde à percentagem da redução permanente da capacidade geral de ganho do trabalhador (incapacidade parcial inferior a 30%), pelo que o seu pagamento fica suspenso até que ocorra a aposentação do trabalhador, altura em que terá direito a receber a reparação pelo acidente, sendo neste caso, a mesma acumulável com a pensão de aposentação mas apenas no montante que exceda aquela (pagamento da pensão por incapacidade que é depois deduzida na pensão de aposentação).

Esta questão foi objecto de pronúncia pelo Tribunal Constitucional, em sede de fiscalização sucessiva na sequência de pedido formulado por S. Exª. Sr. Provedor de Justiça - Acórdão n.º 786/2017, que concluiu no sentido de que este regime não viola o direito fundamental à justa reparação por infortúnio laboral, nem o princípio da igualdade (respectivamente, artigo 59.º, n.º 1, alínea f), e artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa).

Por força desta alteração, em todos os acidentes de trabalho ocorridos a partir de 2014, e que tenham como consequência incapacidades permanentes parciais inferiores a 30% os sinistrados ficam impedidos de receber a pensão correspondente até ao momento da sua aposentação e que será depois paga pela Caixa Geral de Aposentações (doravante CGA) que deve ser reembolsada das despesas e prestações que tenha suportado pela entidade empregadora, independentemente da respectiva natureza jurídica ou grau de autonomia.

Tal impedimento redunda na irreparabilidade dos danos causados na saúde, no corpo e na capacidade de aquisição de ganho, daqui resultando uma grosseira violação do direito dos trabalhadores em funções públicas à assistência e justa reparação dos acidentes de trabalho, consagrada na alínea f) do nº 1 do art.º 59º da Constituição a República.

Por outro lado, tendo em conta a distância temporal, que pode atingir décadas, até ao momento da aposentação e efectivo recebimento, ocorrerá certamente uma degradação progressiva do valor a receber, atentando também contra o estatuído na al. f) do artº 59º da CRP.

Desde a publicação do Código do Trabalho, em 2003 - Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto - que se verifica uma tendência crescente de aproximação dos regimes de trabalho privado e público, incluindo em matéria de segurança e saúde no trabalho pelo que o regime de reparação de acidentes de trabalho deveria também convergir.

Estabelece-se, portanto, aqui uma atroz diferenciação entre trabalhadores. O trabalhador em funções públicas é visto apenas como um objecto de trabalho não sendo considerada a repercussão - dano corporal - que uma lesão permanente e duradoura por acidente de trabalho possa ter na sua existência como indivíduo.

Num momento em que os direitos laborais dos trabalhadores públicos e privados se aproximam não se compreende um tratamento tão díspar no ressarcimento dos danos causados em acidente de trabalho.

- O douto Acórdão do Tribunal Constitucional (n.º 786/2017) em nada contribuiu para a aproximação dos dois regimes. Após a prolação desta decisão, apenas o Tribunal Central Administrativo do Sul produziu duas decisões em sentido contrário, sendo ainda, muito ténue a jurisprudência neste sentido.

Urge, pois, uma intervenção legislativa!

CSS da CGTP-IN/Administração Central, Regional e Local

Ação Socialista:

22 março 2025

CSS DA CGTP-IN REUNIU COM O SINTTAV

A Corrente Sindical Socialista da CGTP-IN foi recebida ontem, 21 de Março, pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores das Telecomunicações e Audiovisual (SINTTAV), nomeadamente pelo seu Presidente da Direcção, Manuel Gonçalves e o pelo responsável de Organização, Vítor Correia.

Na reunião houve oportunidade para analisar a situação social e política, as dificuldades que se deparam ao movimento sindical em geral e a necessidade de todos coordenarmos esforços no sentido de reforçar a CGTP-IN porque o seu reforço projecta-se em todo o movimento sindical.

A delegação da Corrente foi composta pelo Secretário-Geral, Fernando Gomes e por Ludovina Sousa do Secretariado Nacional da CSS da CGTP-IN.

13 março 2025

Eleições legislativas: desafios para o PS e para o mundo do trabalho (Acção Socialista n.º 1678 de 13.03.2025)

 Autor (a): Fernando Gomes

O Governo da AD (PSD/CDS) empurrou o país para umas eleições que nem o país (especialmente os trabalhadores) nem os partidos políticos queriam, por imprudência e falta de seriedade do primeiro-ministro e a subserviência do Governo. Umas eleições que se realizarão num momento de grandes transformações a nível europeu e mundial decorrentes das políticas disruptivas e antiprogressistas de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos da América.

À crise política para a qual o país foi arrastado, por Luís Montenegro, devido à sua recusa em dar explicações claras e inequívocas sobre a actividade da sua empresa, a Spinumviva, junta-se a incompetência e incapacidade do Governo para resolver os problemas do país, como são os casos mais dramáticos da saúde, educação e habitação. O chumbo da moção de confiança do Governo da AD leva-nos à realização de eleições legislativas antecipadas.

Só o Partido Socialista é alternativa à direita e extrema-direita

Neste contexto social e político, cabe ao Partido Socialista (PS) a construção de uma alternativa política com um forte pendor social que valorize os trabalhadores, que promova o aumento dos salários e das pensões, que dê resposta à degradação das condições de trabalho (segurança e saúde no trabalho), tanto no sector público como no privado, e que defina uma estratégia de estudo e combate às doenças profissionais e acidentes de trabalho.

Precisamos que o PS estabeleça uma estratégia de desenvolvimento social e económico que promova emprego de qualidade e tenha como principal preocupação a fixação dos jovens no nosso país e que, ao mesmo tempo, combata a precariedade dos vínculos laborais.

Em especial, é urgente a resolução dos problemas do Serviço Nacional de Saúde (SNS), desde a valorização dos salários e das carreiras de todos os seus profissionais à criação de incentivos que façam regressar quem nos últimos anos tem saído do SNS.

O PS deve reforçar a política que vinha a ser seguida pelos nossos governos, com um forte investimento na habitação, para que a oferta pública tenha um efeito regulador do mercado de arrendamento.

É reconhecido por todos os empresários a falta de mão-de-obra, que não se limita à altamente qualificada. Neste sentido, o problema da imigração tem de ser encarado com responsabilidade. Portugal tem de promover políticas públicas de acolhimento e integração dos imigrantes que nos procuram.

Tendo presentes os valores e princípios do Partido Socialista, da liberdade, da igualdade e da solidariedade, profundamente humanista, assim como o histórico de uma boa governação nesta área, deve ser aberto um processo de regularização extraordinária da situação dos imigrantes em Portugal, independentemente da sua origem e envolvendo todos os actores sociais (associações de imigrantes, sindicatos, associações empresariais, organizações e entidades de solidariedade, entre outros), que tenham entrado em Portugal até 31 de Dezembro de 2024 e que disponham de condições económicas mínimas para assegurarem a subsistência, designadamente pelo exercício de uma actividade profissional remunerada, demonstrada pelos respectivos recibos salariais ou, na sua falta, por atestados de organizações idóneas.

A Corrente Sindical Socialista da CGTP-IN (CSS da CGTP-IN) defende que um governo do PS deve ter uma relação privilegiada com as organizações sindicais, tanto da CGTP-IN como da UGT, ouvindo e respondendo aos anseios que emanam da classe trabalhadora.

Envolvendo os trabalhadores e o povo em geral, fomentando a confiança e gerando a esperança, o PS tem condições para vencer as próximas eleições.

Portugal necessita de tranquilidade, e os portugueses de bem-estar, justiça social e segurança para enfrentarem e vencerem os enormes riscos do presente e construírem o futuro que é necessário – e este somente o Partido Socialista tem condições para construir.

Os desafios para o mundo do trabalho

Os sindicalistas da Corrente Sindical Socialista da CGTP-IN têm defendido, no seio da Confederação, que se promovam convergências sindicais a todos os níveis, entre as organizações sindicais de empresas, sectores de actividade e das confederações sindicais, das quais resultem a melhoria dos salários e dos direitos para os trabalhadores e trabalhadoras.

Político-sindicalmente, entendemos que o movimento sindical, mantendo firmemente a sua autonomia, deve defender que os partidos das esquerdas devem trabalhar para a construção de alianças políticas alternativas à direita e extrema-direita, como forma de retomarmos o modelo de governação que existiu entre 2015 e 2019, com o objectivo de serem realizadas políticas que resolvam os problemas com que o país e os trabalhadores se defrontam.

Perante as incertezas que vivemos e os processos eleitorais que se avizinham, eleições legislativas, autárquicas e presidenciais, o movimento sindical, em geral, e de forma muito especial a CGTP-IN e os seus sindicatos, precisam de reforçar a sua influência nos locais de trabalho e na sociedade, em particular, relançando a CGTP-IN no espaço público.

Enquanto sindicalistas socialistas da CGTP-IN e também muitos independentes que trabalham com a Corrente Sindical Socialista, tudo faremos para reforçar e proteger a CGTP-IN e os seus sindicatos através do aprofundamento do seu funcionamento democrático e da construção da unidade na pluralidade, desde os locais de trabalho até à estrutura confederal, sempre tendo presente o objectivo primeiro de defender os justos interesses da classe trabalhadora.

É imperativo que a CGTP-IN faça uma discussão interna, em que participem activamente os sindicalistas de todas as correntes de opinião político-ideológicas (COPI), que leve à definição de um conjunto de reivindicações sindicais a discutir com os partidos das Esquerdas, no sentido de contribuir para a resolução dos problemas que afectam o país e os trabalhadores.

O combate eficaz à direita e extrema-direita faz-se com a resolução dos problemas do país e dos trabalhadores, e esse objectivo será mais facilmente conseguido se trabalharmos para a existência de convergências sindicais entre as organizações sindicais de empresas, sectores de actividade, mas também ao nível das confederações sindicais, CGTP-IN e UGT, sempre no respeito pela natureza e identidade de cada organização.

Ação Socialista:

https://www.accaosocialista.pt/?edicao=1678#/1678/eleicoes-legislativas-desafios-para-o-ps-e-para-o-mundo-do-trabalho


12 março 2025

FALECEU DANIEL CABRITA, UMA MEMÓRIA VIVA DO SINDICALISMO PORTUGUÊS

 QUE O SEU EXEMPLO SEJA UMA INSPIRAÇÃO PARA AGIRMOS NESTES TEMPOS EM QUE VIVEMOS

Faleceu Daniel Cabrita.

Na História do Sindicalismo em Portugal a partir dos anos sessenta do século XX, Daniel Cabrita tem um merecido lugar cimeiro. A sua vida é um exemplo de abnegação ao sindicalismo, o mesmo é dizer ao combate dos trabalhadores e trabalhadoras por mais direitos e melhores salários, pela Justiça Social, pelo 25 de Abril e, em particular, de dedicação à CGTP-IN.

A vida de Daniel Cabrita confunde-se com a História contemporânea de Portugal, no campo sindical.

Em 3 de Agosto de 1968, o ditador Oliveira Salazar teve um acidente que o impossibilitou definitivamente de continuar a exercer a sua função de Presidente do Conselho de Ministro. A partir de 27 de Setembro desse ano, Marcelo Caetano substitui-o nessa função. Considerando o desaparecimento da figura tutelar que o fundou, M. Caetano realizou uma operação de maquilhagem do regime fascista para lhe dar continuidade.

Entre as inúmeras medidas dessa operação, foram alteradas várias legislações referentes às relações de trabalho, à contratação colectiva e aos sindicatos, os então designados “sindicatos nacionais”, conforme a designação da organização corporativa do regime.

É neste contexto que Daniel Cabrita, natural do Barreiro, onde nasceu em 1938 e enquanto trabalhador bancário no Banco TOTTA & AÇORES, é um dos muitos antifascistas que, aproveitando-se dessa (falsa) abertura da ditadura, se integrou na actividade sindical, concretamente, no seu sindicato, o Sindicato Nacional dos Bancários do Sul e Ilhas.

Depois do natural percurso como activista sindical sob o fascismo, ou seja, alvo de vigilância, perseguições e intimidações, tomou posse como presidente do sindicato em Janeiro de 1969. Este facto representou que o sindicato passou a ter uma Direcção de confiança dos trabalhadores e tinha saído do controle do Governo fascista.

Nesta qualidade, interveio na actividade sindical nos bancários, mas não só, pois alargou a sua participação a outras actividades sindicais que então se desenvolveram.

Concretamente, também noutros sindicatos tinha havido processos semelhantes ao do Sindicato dos Bancários e neles tinham sido eleitas direcções sindicais de confiança dos trabalhadores.

É neste quadro, que se realizaram várias reuniões entre estes sindicatos, da qual emergiu, em 1 de Outubro de 1970, a INTERSINDICAL. Daniel Cabrita participou activamente neste processo sindical.

Devido a este empenhamento, Daniel Cabrita foi preso pela PIDE-DGS em Junho de 1971, acusado de ser membro do PCP. Com a prisão política, veio a tortura e a condenação em tribunal, tendo sido libertado em Junho de 1973. Esta prisão teve o repudio de muitas confederações sindicais internacionais e a respectiva solidariedade ao Daniel Cabrita.

Em Portugal, a onda de solidariedade foi muito significativa, destacando-se a manifestação de solidariedade de centenas de bancários realizada em Lisboa à hora do almoço, que enfrentou a polícia.

Após o 25 de Abril, Daniel Cabrita exerceu funções no Ministério do Trabalho e, a partir de 1976, passou a integrar os quadros da CGTP-IN, como adjunto do Coordenador, depois, designado Secretário-geral.

Daniel Cabrita foi um Homem que viveu intensamente as transformações políticas do seu tempo. Pessoalmente, o que se destacava nele, era o seu profundo humanismo.

Se, antes do 25 de Abril, a acção sindical tinha uma indiscutível e totalmente necessária dimensão unitária entre todos os activistas antifascistas, independentemente das opções ideológicas de cada um(a), o que implicava uma abordagem humanizada nas relações políticas, a singularidade de Daniel Cabrita é que nunca perdeu essa característica humana depois da Revolução.

Convicto, mas sóbrio, o Daniel relacionava-se cordialmente com todos os sindicalistas. Mesmo quando as discussões eram duras, não se lhe sentia animosidade, mas, sim, uma atenção que transmitia respeito pelas posições que cada um(a) defendia, mesmo quando se sabia que discordava delas. Esta discreta solidez emocional, mesmo nos momentos mais tensos, fazia do Daniel Cabrita um factor de estabilidade unitária.

Nos tempos turbulentos que estamos a viver, em que grandes e profundas transformações reaccionárias estão a decorrer velozmente, o exemplo do percurso de vida e da entrega a um ideal do Daniel Cabrite e, em particular, das suas características pessoais, é profundamente inspirador.

Combater para vencer a actual situação político-social implica regressar às origens em muitas dimensões, em particular, à unidade, à fraternidade e à solidariedade, acções que o Daniel efectivou e partilhou abundantemente com aqueles que tiveram o ensejo de trabalhar com ele.

À família, aos Amigos e à CGTP-IN, a Corrente Sindical Socialista da CGTP-IN expressa as suas mais sentidas condolências pela perda do Daniel Cabrita.

Lisboa, 12 de Março de 2025

O Secretariado Nacional da CSS da CGTP-IN


06 março 2025

Trabalhar para viver ou viver para trabalhar? (Acção Socialista n.º 1670 de 27.02.2025)

Autor (a): Eduardo Chagas

Uma grande maioria da população trabalhadora gostaria de trabalhar menos e de poder cessar a sua atividade profissional numa idade em que possa ainda desfrutar, com condições dignas, uma reforma tranquila, com a família e amigos.

Existem, no entanto, atividades que pela sua natureza, penosidade ou perigosidade, justificam um tratamento diferenciado daquele que está estabelecido para a maioria dos trabalhadores.

Em tempos de governação por partidos de direita, invariavelmente, é questionada a sustentabilidade do sistema de pensões e da segurança social, sempre na perspetiva de provar a inevitabilidade de dar ao setor privado uma fatia cada vez maior deste apetecível “negócio”.

Assim acontece atualmente com o governo da AD, que criou um grupo de trabalho para discutir a sustentabilidade da segurança social, para o qual nomeou um conhecido defensor acérrimo da privatização do sistema e que, como recordou o deputado Tiago Barbosa Ribeiro na AR, “faz parte do Conselho Estratégico Nacional do PSD e que há anos escreve e dá entrevistas em tom cataclísmico sobre o futuro da Segurança Social”.

Ao mesmo tempo, um grupo de trabalho criado já pelo anterior governo e relançado pelo atual em outubro, deverá elaborar um “estudo das profissões de desgaste rápido”. Em reunião com os parceiros sociais no passado mês de janeiro, foi apresentado um documento síntese antecipando a apresentação do estudo final, prevista para março deste ano, no qual, por um lado se questiona a manutenção dos regimes especiais já existentes (trabalhadores marítimos e da pesca, mineiros, desportistas, controladores de tráfego aéreo, entre outros), e, por outro, se defende a ideia de que, apesar de exercerem profissões de desgaste rápido, os trabalhadores não deveriam ter bonificação no acesso à idade de reforma, mas antes ser reconvertidos para outras atividades que lhes permitam continuar a trabalhar até à idade normal de aposentação. Não é feita qualquer referência ao impacto que a dita atividade de desgaste rápido possa ter tido na saúde física e psíquica do trabalhador.

Entretanto o Bloco de Esquerda, está a promover uma petição à AR que pretende a alteração do regime aplicável ao trabalho por turnos e noturno, incluindo entre outras, a redução da idade de acesso à reforma.

Vem isto a propósito dos contactos que, na qualidade de dirigente do Sindicato Oficiaismar, efetuei recentemente com um coletivo “invisível” de trabalhadores, que integram a equipa de controlo e segurança das operações portuárias.

 

Operador de VTS – a segurança em solitário

O operador de VTS (Vessel Traffic Service, ou Serviço de Tráfego de Navios) contribui para assegurar operações marítimas seguras e eficientes, providenciando um serviço de segurança da navegação, salvaguarda da vida humana no mar, prevenção da poluição nos portos e  nas suas áreas de aproximação. Deste modo, a estes profissionais incube a vigilância e a monitorização do tráfego marítimo podendo despoletar o fornecimento de serviços náuticos, adequados e atempados, em situações de emergências marítimas. Na sua maioria são profissionais detentores de curso superior da Escola Superior Náutica Infante D. Henrique, muitos com experiência de trabalho como oficiais a bordo de navios da marinha mercante.

Este pequeno coletivo de trabalhadores e trabalhadoras, asseguram um serviço por turnos, 24 sobre 24 horas por dia, 365 dias por ano, sendo normalmente um único operador VTS por turno. Isso implica, por exemplo, que as refeições são tomadas na própria bancada de trabalho… Ou que, quando um dos colegas que forma a equipa adoece, ou tira férias, são os restantes colegas que devem assegurar os turnos que ele deixa de fazer, e nalguns casos sem qualquer compensação adicional em folgas ou monetária.

Na ronda de contactos pelos VTS dos portos de Leixões, Aveiro, Lisboa, Setúbal e Sines, tomei conhecimento de viva voz da dura realidade que vivem os operadores de VTS. E é uma realidade comum a muitos dos que fazem trabalho por turnos e noturno, com a particularidade de o fazerem sós no seu posto de trabalho: impactos negativos sobre a saúde – maior incidência de cancro, diabetes tipo 2, transtorno dos hábitos alimentares, alteração do sono, fadiga, stresse, etc. - e sobre a vida familiar e social.

Vários artigos consultados, atribuem à Organização Internacional do Trabalho a afirmação de que por cada 15 anos de trabalho noturno, os trabalhadores perdem 5 anos de vida! Entre os operadores de VTS no ativo, vários têm mais de 20 anos de serviço, em regime continuado de turnos, incluindo trabalho noturno.

Assim, e embora consideremos que uma revisão geral do atual quadro de profissões de desgaste rápido seja um exercício que arrisca somar mais perturbação no panorama laboral português, justificar-se-ia a análise, caso a caso, de respostas para grupos específicos de profissionais. Não é possível continuar a olhar para o outro lado, e, com o argumento de que se fará uma avaliação conjunta de todos os casos, deixá-los ad eternum entregues à sua (má) sorte. É imperativo atuar, embora tarde, no sentido de dar a estes trabalhadores uma perspetiva de poder desfrutar, com um mínimo de qualidade de vida, os seus anos de reforma. Ao Partido Socialista sugerimos a apresentação de uma proposta que garanta um regime de redução gradual da idade de acesso à reforma, consoante o número de anos trabalhado nessas funções, sem perda de direitos.


Ação Socialista:

https://www.accaosocialista.pt/?edicao=1670#/1670/trabalhar-para-viver-ou-viver-para-trabalhar